O assunto do momento é a revisão da vida toda, que estava novamente em debate no Supremo Tribunal Federal. Mas são boas as notícias, o Tribunal confirmou a decisão anterior no sentido de reconhecer a revisão da vida toda, de forma a beneficiar inúmeros segurados.
A partir de tal decisão, muitos questionamentos surgem sobre esta revisão de forma que se faz necessário o presente artigo, que tem como objetivo esclarecimentos quanto aos principais pontos da revisão da vida toda. Continue conosco e não esqueça de compartilhar esse artigo.
O que é revisão da vida toda?
A revisão da vida toda pretende a contabilização de contribuições que foram desprezadas diante da Reforma da Previdência em 1999, por meio da Lei 9.876/99. Esta lei alterou o artigo 29 da Lei 8.213/91, que estabelece a forma de cálculo do salário de benefício.
A partir dessa nova lei, o artigo que então previa que o salário de benefício era estabelecido a partir da média de contribuições dos últimos 36 salários de contribuição, agora determinava que o cálculo seria a partir da média aritmética de 80% dos maiores salários de contribuição.
Porém, a problemática ocasionada por essa lei está no acréscimo de uma regra de transição em seu §3º:
Art. 3º Para o segurado filiado à Previdência Social até o dia anterior à data de publicação desta Lei, que vier a cumprir as condições exigidas para a concessão dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, no cálculo do salário-de-benefício será considerada a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994, observado o disposto nos incisos I e II do caput do art. 29 da Lei no 8.213, de 1991, com a redação dada por esta Lei.
O fato é que desprezando as contribuições do período anterior a 1994 – implantação do Plano Real - passou a prejudicar muitos segurados que possuíam elevadas contribuições no referido período de modo que, consequentemente, elevaria o valor do seu salário de benefício.
Assim, inúmeros casos chegaram aos Tribunais para análise até que em 2019 o STJ, por meio dos REsp 1596203 e 1554596, se posicionou no sentido de permitir a aplicação quando mais favorável das regras previstas na Lei 8.213/91 para os segurados que ingressaram no sistema em período anterior a Lei 9.876/99. Ou seja, possível a contabilização das contribuições anteriores a 1994, para fins de cálculo da RMI do benefício, assim, dando início a possibilidade da revisão da vida toda.
Firmou-se então o Tema 999 do STJ no sistema dos recursos repetitivos "Aplica-se a regra definitiva prevista no artigo 29, incisos I e II, da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no artigo 3º da Lei 9.876/1999, aos segurados que ingressaram no Regime Geral da Previdência Social até o dia anterior à publicação da Lei 9.876/1999."
De forma contínua, diante da injustiça frente aquele verteu boas contribuições, chegou ao STF a questão da revisão do valor do benefício, daqueles que foram atingidos por esta regra de transição extremamente desvantajosa.
Assim, por meio de Recurso Extraordinário (RE) 1276977, com repercussão geral -Tema 1.102 – foi discutida esta matéria, chamada de revisão da vida toda.
O que ficou estabelecido, e reafirmado pelo STF, foi que havendo prejuízo para o segurado é possível requerer a revisão da vida toda, com o intuito de assegurar a contabilização das contribuições realizadas no período anterior a julho de 1994.
Foi considerado que a regra de transição estava violando o princípio da isonomia, uma vez que os segurados mais antigos que possuíam contribuições anteriores a 1994 estavam em desvantagem em relação ao segurado mais novo que teve todo seu período de vida contributiva contabilizado para fins de cálculo do salário de benefício.
Desse modo, a tese firmada em 1º de dezembro de 2022 assim prevê “O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26/11/1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC em 103/2019, que tornou a regra transitória definitiva, tem o direito de optar pela regra definitiva, acaso esta lhe seja mais favorável”.
Quais benefícios que podem ser revisados?
A revisão da vida toda não atinge apenas as aposentadorias, outros beneficiários podem se valer da revisão da vida toda, e é muito importante ter ciência dessa possibilidade. Assim, é possível requerer a revisão da vida toda em face dos seguintes benefícios:
Aposentadoria por idade;
Aposentadoria por incapacidade permanente (antiga aposentadoria por invalidez);
Aposentadoria por tempo de contribuição;
Auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença);
Quem pode requerer?
Esta é uma importante questão, pois engana-se quem pensa que todos os aposentados e pensionistas que tiverem seu benefício concedido após 26 de novembro de 1999 podem requerer a chamada revisão da vida toda. Na realidade é preciso observar os seguintes pontos:
Benefício concedido a no máximo 10 anos, uma vez que incide a prescrição, sendo que se inicia a contagem a partir do primeiro dia do mês seguinte ao recebimento da primeira prestação;
O segurado ter vertido contribuições ao INSS no período anterior a julho de 1994;
Benefícios Pré-Reforma da Previdência estão aptos à revisão da vida toda, tendo em vista que após houve a alteração na forma de cálculo;
É de extrema valia ressaltar que esta revisão é mais interessante para quem ganhava mais antes de 1994 e consequentemente contribuía mais, possui poucas contribuições após 1994 e começou a ganhar menos após 1994.
Quanto vou receber?
Esse é o principal questionamento do segurado que preencheu os requisitos acima e deseja requerer a revisão da vida toda. Entretanto, tudo vai depender de um complexo cálculo.
Isso porque, como menciona acima, em julho de 1994 houve a implantação do Plano Real, momento em que o houve alteração da moeda corrente.
Desse modo, é preciso se valer de cálculos de conversão das moedas anteriores ao real – cruzeiro, cruzeiro novo, cruzeiro real, cruzado e cruzado novo – para a então moeda vigente que é o real, e assim chegar ao valor correto do benefício previdenciário.
Ademais, é preciso fazer o cálculo dos valores em atraso, com a incidência de atualização monetária e juros, o que envolve mais cálculos. Além disso, será calculado o novo salário de benefício, que sofrerá um aumento devido à revisão da vida toda.
Desse modo, conclui-se que sim, é preciso fazer uma série de cálculos para então decifrar qual o valor que será devido a partir de então a titulo de salário de benefício, bem como o montante a título de valores atrasados.
Resumindo, é recomendado procurar um especialista, para então ter certeza do valor que irá receber e se compensa ingressar com uma ação de revisão da vida toda.
É obrigatório entrar com um processo?
Falando em ação, sim, é preciso se valer do Judiciário para ter o direito à revisão da vida toda garantido. Isso se justifica pelo fato de ser uma forma de rever um ato administrativo praticado pela Autarquia Previdenciária e que se deu de forma ilegal, e que foi reconhecido no âmbito judicial, de maneira que não ocorrerá aplicação automática no âmbito administrativo.
Logo, para devida aplicação do entendimento exposto pelo STF é preciso requerer na via judicial a aplicação deste entendimento e revisão do benefício.
Para esse requerimento, recomenda-se que tenha o segurado em mãos:
CNIS;
Documento de Identidade;
CPF;
Carteira de trabalho;
Carnês de recolhimento da contribuição;
Processo administrativo ou cópia da carte de concessão da aposentadoria;
Cálculo do tempo de contribuição;
Cálculo da Renda Mensal Inicial – RMI do valor devido considerando as contribuições anteriores 1994;
Procuração;
Processo em andamento
Quando o tema começou a circular nos meios de comunicação, muitas pessoas procuraram escritórios de advocacia para se anteciparem e já ingressaram com uma ação judicial de revisão da vida toda. A pergunta é, a partir da decisão do STF que confirmou o reconhecimento dessa possibilidade, como ficam os processos que estavam em andamento?
Bem, estes processos estavam sobrestados até que o STF julgasse o tema afetado. Então, a partir dessa decisão agora confirmada, os processos voltarão ao curso.
Com isso, por se tratar de tese com repercussão geral, caso o segurado preencha os requisitos para a revisão da vida toda, deve o Tribunal aplicar o entendimento pacificado.
Tutela de evidência
A tutela de evidência é uma modalidade de tutela provisória que nem todos conhecem. Primeiramente, tem-se tutela provisória como uma forma de ter garantido seu direito de forma anterior a cognição exaustiva, diante da apresentação de provas que demonstram a probabilidade de ter reconhecido o direito requerido.
A tutela de evidência em específico se caracteriza por ser concedida independente da demonstração do perigo de dano, dentro das hipóteses previstas no artigo 311 do Código de Processo Civil.
No caso do requerimento de tutela de evidência na revisão da vida toda, a qual pode ser requerida no início ou no curso do processo, aplica-se o artigo 311, inciso II:
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
Logo, a partir da tese firmada pelo STF é perfeitamente possível requerer a tutela de evidência para ter a tese imediatamente aplicada e consequentemente garantir o aumento do seu salário de benefício.
Quanto tempo demora para ser liberada a revisão?
Não é possível estimar um prazo certo para a conclusão da revisão da vida toda. O que pode ocorrer como visto acima é a possibilidade de requerimento da tutela de evidência para ter o direito antecipado de maneira provisória.
O tempo da ação também depende de onde o processo parou, quando já tinha o segurado um processo em andamento. Em determinados casos, quando parou pouco antes da sentença, será mais rápido, pois voltará ao curso a partir de então e se analisará os requisitos para aplicar a tese da revisão da vida toda.
Muitos já tinham o processo em andamento uma vez que já estava disponível a ementa do tema afetado, bem como agora era apenas uma confirmação. Desde o ano de 2019 se garantiu a possibilidade da revisão da vida toda por meio de decisão do STJ.
Portanto, é um tema que há anos movimenta o judiciário e agora tem-se uma decisão a ser seguida em relação a este tema.
Vale a pena?
Depende! Muitas vezes se o período anterior a 1994 corresponde ao início da carreira, as contribuições previdenciárias tendem a ter menor valor do que após, quando se tem uma carreira mais estabilizada. Nesse caso, não vai valer a pena porque os valores maiores de contribuição foram posteriores a 1994.
Porém, quando houveram salários mais altos nesse momento anterior a 1994, nesse caso sim a partir da realização de cálculos será possível analisar qual a vantagem financeira que a revisão da vida toda terá.
Considerações finais
A revisão da vida toda é um tema além de importante muito complexo na prática, uma vez que envolve uma série de cálculos, conversões de moeda e análise da condição mais vantajosa. Mais ainda, é uma vitória para os segurados que foram extremamente prejudicados pela regra de transição prevista na Lei 9.876/99.
A legislação então passou a desprezar os salários de contribuições vertidos no período anterior a 1994, que foi o ano da implantação do Plano Real no Brasil. Contudo, aqueles segurados que tinham salários altos nesse período foram prejudicados, pois perderam a oportunidade de terem o valor do benefício mais alto.
Falando em benefício, é importante ressaltar que a revisão da vida toda não atinge apenas as aposentadorias, mas também o auxílio por incapacidade temporária e a pensão por morte.
Para requerer a revisão, tendo em vista que essa possibilidade foi garantida pelo Judiciário é preciso ingressar com uma ação judicial para ter seu direito adquirido. Porém, para saber se realmente vale a pena o requerimento é recomendado solicitar todos os cálculos para então poder comparar os valores dos benefícios.
Ainda, são requisitos ter contribuições anterior a julho de 1994, preferencialmente serem salários de contribuição com valores altos e também deve-se observar o prazo de 10 anos desde a concessão do benefício.
Por fim, reafirma-se que nada mais justo do que ter direito de incluir no cálculo do benefício previdenciário todas as contribuições vertidas para a Autarquia Previdenciária, em especial as que elevam o valor do benefício. Portanto, a decisão proferida pelo STF é muito importante para os segurados da Previdência Social receberem um valor justo a título de benefício previdenciário após anos de contribuição.